A filosofia esotérica ensina que o ser humano
tem
sete princípios ou níveis de consciência. O
primeiro
deles é o físico, Sthula-sharira. O
segundo é o princípio
vital, ou Prana. O
terceiro, Linga-sharira, o “modelo”
cármico sutil do corpo físico, que inclui o
patrimônio genético.
O quarto, Kama, é o centro das
emoções pessoais e animais. O
quinto princípio é Manas, a
mente. Buddhi é o sexto princípio,
a inteligência espiritual, a alma
imortal. Atma é o sétimo
princípio, o princípio supremo, o verdadeiro eu, e
também a
consciência universal impessoal: o verdadeiro ser
não é “alguém”.
O texto a seguir investiga a relação
entre Buddhi e as emoções.
A vida é mais complexa do que
parece. Buddhi, o sexto princípio da consciência humana, não funciona como um
bloco compacto, mas como uma tríade.
A alma espiritual é o nível de consciência simbolizado - na
lenda cristã - pela figura de Jesus Cristo. Buddhi é aquele que se sacrifica.
Ele desce ao plano da alma mortal e do mundo externo, encarna, é crucificado
neste plano, e vive a ressurreição. A ressurreição ocorre no pós-morte, através
do Devachan, ou na vida concreta, através do caminho teosófico e iniciático, e
como resultado de um esforço que dura várias encarnações.
Na sua relação dinâmica com a alma mortal, Buddhi é uma
tríade:
1) Buddhi em si;
2) Buddhi-Manas;
3) Buddhi-Kama.
Buddhi-manas é a combinação de Buddhi com o mundo
mental. E existe também a combinação de Buddhi com o mundo emocional
pessoal, Buddhi-kama. Esta última não é um processo
fácil.
Buddhi-Manas, sem Buddhi-Kama, está sujeito a um “sequestro
emocional” (termo criado por Daniel Goleman). O sequestro ocorre quando emoções
inferiores “roubam” ideias espirituais e colocam o discurso altruísta a serviço
de objetivos egocêntricos.
É comum surgir uma desconexão entre as emoções e ambições
pessoais profundas e as ideias universais que o indivíduo
adotou.
Então as emoções anti-evolutivas desafiam veladamente os ideais
filosóficos, e tratam de usar as ideias generosas para seus fins egoístas. Isso
configura o “sequestro” do que é generoso por parte daquilo que é
anti-evolutivo. Esta luta deve ser compreendida, porque ela ocorre na maior
parte das pessoas e traz perigo real.
O que produz um progresso espiritual verdadeiro, portanto, não
é apenas aumentar as ideias e o conhecimento no plano conceitual, como se as
ideias tivessem peso próprio decisivo. Ideias são feitas de ar e não de terra. O
que trará progresso, além de ter ideias filosoficamente corretas, é examinar
constantemente os sentimentos pessoais, olhando para eles desde o ponto de vista
de Atma e Buddhi. Isso diminuirá o peso dos sentimentos opacos e inferiores, e
irá restaurar o equilíbrio necessário entre os dois pratos da balança: o prato
de Buddhi-Manas, e o prato de Buddhi-Kama.
Buddhi-Kama é feito pelas emoções da alma imortal, e
entre elas está o sentimento do herói, que enfrenta perigos por uma causa maior
e renuncia voluntariamente à sua vida menor para fazer a jornada nobre do
auto-sacrifício, vivendo a vida maior. Esta decisão voluntária produz a devoção
pelo companheiro de caminhada que é mais experiente, a devoção pelo crescimento
e aprendizagem de todos os seres, e a devoção pelo mestre - ou mestres - como
fontes de ensinamento sagrado.
Devoção é o amor do pequeno pelo grande, do terrestre
pelo celestial. A percepção intelectual do divino fica prejudicada sem a sua
contrapartida emocional, o amor pelo mundo divino e seus habitantes. Este
compromisso maior gera a psicologia do herói em sua jornada épica, cujo nome
técnico é “discipulado”.
O aprendiz deve examinar com cuidado o processo da aspiração
espiritual em si mesmo. Deve verificar se há um equilíbrio entre dois
elementos:
A) De um lado, a curiosidade intelectual-búdica, a
vontade de compreender a si mesmo e ao
universo.
B) De outro lado, a vivência emocional-búdica, a ânsia
por contribuir altruisticamente com a Causa da evolução humana e com o bem-estar
de todos os seres.
No plano intelectual, buscamos a verdade. No emocional,
buscamos retribuir à vida por aquilo que ganhamos dela.
Quando a relação na balança entre pensamentos e sentimentos é
disfuncional, ao invés de existirem emoções búdicas e pensamentos búdicos lado
a lado nos dois pratos, temos emoções de raiva, competição, inveja e rancor -
ao lado de pensamentos universais e búdicos.
Desta maneira, a substância que um prato da balança está
pesando é o oposto da substância que o outro prato da balança contém. Em uma
simetria desfavorável, os dois pólos do processo anulam-se reciprocamente, e o
resultado prático é o oposto do amor e da verdade, ainda quando o individuo, no
plano externo, possa usar as palavras e as aparências da
espiritualidade.
Em que condições o fiel da balança é de fato a Sabedoria, como
deve ser?
O equilíbrio se dá na Sabedoria quando os dois pratos da
balança contêm respectivamente VERDADE IMPESSOAL (Buddhi-Manas) e AMOR
ALTRUÍSTA (Buddhi-Kama).
Não é por acaso que o sentimento de Amor pela Verdade está na
origem da palavra “filo-sofia” (“amor ao saber”) e no lema do movimento
teosófico: “Não Há Religião Mais Elevada Que a Verdade”.
Em última instância, a construção do movimento teosófico
autêntico em língua portuguesa depende do despertar de Buddhi, que combina
emoções como devoção e renúncia, por um lado, com pensamentos universais,
impessoais e lúcidos, de outro lado.
A mudança externa da vida de um estudante ocorre quando
emoções sinceras e generosas acompanham passo a passo as concepções
filosóficas.
Quando as emoções não acompanham os pensamentos universais,
elas passam a contrapor-se ativamente a eles. Alimentadas pelas motivações e
pelas ações reais no mundo externo, as emoções passam então a ser OPOSTAS aos
pensamentos e ao discurso de natureza universal. Elas passam a desafiá-los, a
boicotá-los. Levam o indivíduo a odiar, competir e invejar ativamente aqueles
que, em seu mundo pessoal, deveriam co-personificar a vivência do universal.
Daí a luta interna que alguns estudantes enfrentam em suas próprias almas. Daí,
também, as lutas neuróticas e subterrâneas pelo poder e pela “liderança” nos
movimentos esotéricos cuja proposta de ensino e aprendizagem não é a
melhor.
Embora as palavras e os conceitos sejam fundamentais, eles não
bastam. É preciso restabelecer o equilíbrio na balança entre buddhi-manas e
buddhi-kama: a balança entre as ideias e os sentimentos.
A teosofia é búdica. O princípio búdico transforma todos os
aspectos da vida, ainda que isso às vezes tome mais tempo do que se pode
prever.
Em última instância, Buddhi não funciona apenas como uma
tríade, mas é uma luz setenária, cuja energia, além de preservar-se em seu
próprio âmbito búdico, se combina com cada um dos outros seis princípios da
consciência.
A verdadeira luz de buddhi é literalmente como a luz do
sol. Atma é sol, e Buddhi é luz. A luz ilumina tudo, e não só pensamentos. A
luz búdica transforma tudo, ou não transforma nada. Ela desmancha todas as
paredes e proteções, ou não é búdica. Palavras sobre a luz não substituem a
luz. Quando o estudante percebe a luz, ele compreende que ela ilumina tanto
coisas agradáveis como coisas desagradáveis. Ele deve concentrar o foco da visão
na luz, evitando a dispersão, porque no seu devido tempo a visão universal
transmuta todas as coisas para melhor. O buscador da verdade deve manter a
visão ampla e o foco preciso. Deve ser fundamentalmente otimista, porque está em
contato prioritário com o que é ótimo. Num segundo plano, deve ser calmamente
rigoroso e severo em relação às ilusões, porque só há progresso real na medida
em que elas são deixadas de lado.